sexta-feira, 27 de março de 2009

Partilha

Uma das coisas mais excitantes que se podem fazer com os resultados do teste genético da 23andme consiste em partilhar a informação com outros, à procura de parentes desconhecidos. Faz-se assim: quando encontramos, por exemplo nos fóruns do site, alguém com quem temos curiosidade em comparar os nossos genes, é só enviarmos-lhe um convite e esperar pela resposta.

Quase toda a gente aceita partilhar a sua informação genética ao nível “básico”, ou seja desde que não se revelem quaisquer pormenores específicos do seu ADN, em particular sobre riscos de doença. Partilhar com desconhecidos custou-me um bocadinho no início, mas rapidamente percebi que a minha privacidade não estava em jogo e fiquei viciada. Neste momento, já tenho 17 “amigos” nesta rede social genética, todos eles perfeitos desconhecidos (que eu convidei ou que me convidaram).

Uma vez o convite aceite por ambas as partes, podemos comparar os nossos genomas através de uma funcionalidade chamada “herança familiar”, que permite ver se existem bocados de ADN nos nossos cromossomas que coincidem.

Em princípio, esta opção serve para comparar genes entre familiares próximos, onde se sabe à partida que existem grandes troços de ADN em comum. E, pelo que pude ler, é bastante improvável que venhamos a encontrar este tipo de coincidência genética, por acaso, em pessoas de quem nunca ouvimos falar.

Imaginem portanto o meu espanto ao descobrir que quatro dos meus 17 “amigos” são provavelmente meus parentes, meus “primos” afastados! Custa a acreditar, mas é verdade: quando comparei a minha informação genética, à escala do genoma todo, com essas pessoas, surgiram no diagrama comparativo, pintados a azul, troços inteiros de cromossomas. Com uma das pessoas, a coincidência chegou a abranger uma sequência de 20 milhões de “letras” do ADN no cromossoma 5. Com outra, como se pode ver na imagem (onde ocultei o nome da pessoa, por razões óbvias de direito à privacidade), a coincidência envolve uma sequência de 10 milhões de letras no cromossoma 4.


O que é que isto significa? Significa que, segundo os resultados genéticos parciais que temos, um dos nossos respectivos pais (ou mães) nos transmitiu um bocado de cromossoma idêntico (em inglês, a expressão utilizada é half-identical, para lembrar que esse bocado provem de apenas um dos nossos progenitores). E isso quer dizer que esse pai ou essa mãe, por sua vez, partilhavam ou partilham entre eles ou bocados “meio-idênticos” de ADN – ou seja, eram ou são “primos” (um pouco menos) afastados. E assim sucessivamente, até remontar a um antepassado comum, que terá vivido há uns séculos atrás.

Eis o que me respondeu outro desses meus “primos”, com quem partilho uma sequência “meio-idêntica” de 10 milhões de letras de ADN no cromossoma 9, quando lhe exprimi as minhas dúvidas acerca desta conclusão: “Sim, quer mesmo dizer que temos um antepassado comum, que pode ter vivido há 300-400 anos atrás, conforme a taxa de recombinação genética na região onde vivia. É pouco provável que esse antepassado comum tenha vivido há mais do que 300-400 anos, porque se assim fosse, a recombinação [dos genes a cada nova geração] já teria eliminado [o troço de ADN meio-idêntico] da ancestralidade que ambos partilhamos.” Pareceu-me razoável.

Também perguntei a uma cientista especializada em ancestralidade genética e ela confirmou.

Aparentemente, este tipo de situação não é assim tão invulgar nas comunidades, nomeadamente religiosas, que não se costumavam misturar muito com outras através do casamento – e que ao mesmo tempo fizeram, a dada altura, parte de uma diáspora, espalhando-se pelo mundo devido às mudanças religiosas e políticas nos países onde viviam.

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