“Ça c’est un nom bien de chez nous!” (Esse é um nome mesmo de cá!). Esta resposta, que me foi dada por um alsaciano com quem falei ao telefone há uns anos quando me ofereci para soletrar “Gerschenfeld”, deixou-me estupefacta. Era a primeira vez na minha vida que o meu apelido soava a “de cá” fosse a quem fosse.
Pelo contrário, habituei-me – em França e ainda hoje em Portugal – a ouvir comentários do tipo “ai, que nome tão complicado!” ou “o seu nome não é de cá, pois não?”. Ou, pior ainda, a suportar deformações fonéticas do meu patronímico que vão claramente para além do que seria razoável esperar (“Mme Chantapel? Daqui fala...” foi o início de um outro contacto telefónico inesquecível, também em francês).
Para aqueles que sempre tiveram apelidos “bem de cá”, seja em que país for, isto pode parecer estranho, mas acreditem na minha surpresa e satisfação perante a resposta daquele (imediatamente) simpático interlocutor alsaciano. Afinal, o meu nome talvez fosse mesmo de algum lado...
Agora, relendo as memórias do meu pai que, cinco anos após a sua morte em Paris, e sob o título de Autobombo, acabam de ser publicadas na Argentina (pela Libros del Zorzal) – país para onde ele emigrou da Polónia, com a família, aos seis meses de idade –, descobri uma explicação histórica para a espontânea familiaridade daquele senhor alsaciano em relação a apelidos como o meu.
Os apelidos paterno e materno [Gerschenfeld e Rosenblatt], escreve o meu pai, fazem-me pensar que a minha família provinha da Alsácia ou da Renânia, onde os judeus se tinham instalado no século XIV, após a sua exclusão de França e Inglaterra. Sucessivas expulsões obrigaram-nos a deslocar-se para leste, para outras regiões da Alemanha, e, nos séculos XV e XVI, assentaram finalmente no então Reino de Polónia (que incluía também parte da Ucrânia).
Naquela altura, era proibida a residência de judeus no Império dos Czares, mas na sequência das sucessivas partições do Reino de Polónia, entre 1772 e 1795, mais de 70 por cento dos territórios daquele reino foram anexados ao Império Russo. Dessa maneira, os judeus passaram automaticamente a ser súbditos discriminados daquele império, uma vez que Catarina a Grande lhes impôs a obrigação de permanecer na chamada zona reservada (em russo, Cherta Osedlosti), que abrangia territórios que hoje fazem parte das actuais Polónia, Lituânia, Ucrânia, Roménia e Bielorrússia.
(Páginas do livro, no espanhol original, que contêm esta passagem)
Tudo se explica... Como também se explica que, olhando mais de perto para o mapa das minhas semelhanças genéticas, construído pela 23andme e de que já falei neste blogue, me tenha apercebido de que, embora os “ucranianos” sejam, como já referi, a população cujos genes são os mais parecidos com os meus, o mapa coloca-me na realidade na confluência de populações de todos os cantos de Europa – e em particular da Europa do Norte, onde se incluem os franceses e os alemães.
Por outro lado, também estou muito perto dos austríacos – e, na Europa do Sul, dos italianos –, o que sugere que o percurso dos meus antepassados, talvez antes do fim da Idade Média, poderá ter sido ainda mais acidentado.
Crédito da fotografia que aparece na capa do livro: Mario Muchnik
quinta-feira, 23 de abril de 2009
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